Tribunal não recebe habeas preventivo do PT em favor de Lula

…foro privilegiado “depende da análise das circunstâncias”.

Para o desembargador Vladimir Passos de Freitas, a validade do foro privilegiado “depende da análise das circunstâncias”. Se ficar evidente que uma pessoa foi nomeada a um cargo com o objetivo principal de trapacear a Justiça, o foro privilegiado deixa de valer.

Medida fora apresentada pelo Diretório do partido em Itaperuna, Rio, que pedia ‘salvo conduto’ para que o juiz Sérgio Moro ‘nunca mais conduzisse o ex-presidente coercitivamente’

O desembargador federal João Pedro Gebran Neto, relator dos processos da Lava Jato no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), decidiu nesta terça-feira, 15, não conhecer o pedido de habeas corpus preventivo em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo Diretório do PT do Município de Itaperuna (RJ).

O habeas foi impetrado no dia 8 de março. No pedido, os advogados do diretório requeriam liminarmente a expedição de salvo conduto por Gebran, ordenando ao juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, que ‘nunca mais conduzisse o ex-presidente Lula coercitivamente’ – exceto se demonstrada violação ao artigo 218 do Código de Processo Penal, que prevê a ação em caso de recusa da testemunha a comparecer.

Quatro dias antes de o PT de Itaperuna ingressar com o habeas preventivo o ex-presidente foi conduzido coercitivamente pela Polícia Federal para depor em uma sala no Aeroporto de Congonhas em São Paulo no âmbito da Operação Aletheia, desdobramento da Lava Jato que pegou Lula. Durante quase três horas, o petista foi ouvido pela PF.

O desembargador intimou os advogados constituídos por Lula para que se pronunciassem sobre o habeas corpus. Os advogados do ex-presidente revelaram ‘desinteresse no processamento do feito’.

Segundo o TRF4, a defesa do ex-presidente, em sua manifestação, assinalou. “O requerente (Lula) expressamente não autoriza qualquer forma de representação judicial ou extrajudicial em seu nome, que não seja através de seus advogados legalmente constituídos para representá-lo e defender seus interesses.”

Gebran esclareceu em sua decisão que decretou segredo de Justiça no processo para evitar que ‘múltiplas consultas pudessem inviabilizar o sistema processual do tribunal’ – como já ocorrido em habeas preventivo impetrado anteriormente em favor do ex-presidente. Com a decisão, o sigilo foi levantado.

Se a Justiça entender que houve um abuso do direito, ou seja, que a nomeação foi um artifício para enrolar o processo e fugir da punição, o caso que envolve o ex-presidente permaneceria com o juiz Sérgio Moro.

Já houve uma decisão semelhante. Em 2010, o deputado Natan Donadon (PMDB-RO) renunciou na véspera do seu julgamento no STF para o processo contra ele voltar à primeira instância e dar tempo de prescrever. As acusações de peculato e formação de quadrilha contra ele se arrastavam havia 14 anos.

Por 8 votos a 1, os ministros entenderam que a renúncia não retiraria a competência do STF sobre o caso. A ministra Cármen Lúcia considerou a renúncia uma “fraude processual inaceitável”, pois “teria, em primeiro lugar, o objetivo de fugir à punição”. Para ela, o cargo foi “utilizado como subterfúgio para deslocamento de competências constitucionalmente definidas, que não podem ser objeto de escolha pessoal”.

O caso do ex-presidente Lula é simétrico: em vez de renunciar, ele tomaria posse do cargo de ministro, mas com o mesmo objetivo de escapar da punição.

Para o desembargador Vladimir Passos de Freitas, a validade do foro privilegiado “depende da análise das circunstâncias”. Se ficar evidente que uma pessoa foi nomeada a um cargo com o objetivo principal de trapacear a Justiça, o foro privilegiado deixa de valer.

No caso do ex-presidente Lula, parece haver poucas dúvidas quanto a isso.

Por Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba, Fausto Macedo e Julila Affonso
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