O Ministério Público Federal, através de uma ação movida por 12 procuradores, pede à justiça que afaste, em caráter de urgência, Ricardo Salles do comando do Ministério do Meio Ambiente. O pedido faz parte de uma ação civil pública onde os procuradores da República, que acusam Salles de “desestruturação dolosa das estruturas de proteção ao meio ambiente”.
Os procuradores afirmam que Salles, vem praticando a desestruturação de diversas políticas públicas relacionadas a diversas áreas do ministério, como ações normativas, orçamentárias, de fiscalização e transparência, de maneira dolosa .
Os procuradores querem que o ministro também seja condenado por improbidade administrativa, com punições como perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa e proibição de contratar com o poder público e de receber benefícios e incentivos fiscais. A ação tramita na Justiça Federal do Distrito Federal.
Desde a divulgação do polêmico vídeo da reunião ministerial, solicitado por Sérgio Moro, quando acusou o presidente de tentativa de interferência na Polícia Federal, Ricardo Salles passou a ser marcado pela infeliz observação que fez sobre “passar a boiada”, referindo-se a imprensa e o povo estarem focados na pandemia e que este fato deveria ser aproveitado para que o governo cometesse ações que não seriam percebidas.
Com o agravamento da situação amazônica, com uma negativa repercussão internacional, já se esperava consequências mais duras.
A ação civil pública defende que as declarações de Salles na reunião confirmam o dolo de suas ações à frente do ministério. Na ocasião, ele defendeu que o governo aproveitasse que as atenções da imprensa estavam voltadas para a pandemia do novo coronavírus para “passar a boiada” nas normas ambientais e de outras áreas reguladas por decretos, portarias e resoluções — sem necessidade de aprovação do Congresso.
“As declarações apenas expõem, de forma clara, o que diversos atos já confirmavam: existe um verdadeiro encadeamento premeditado de atuar contrário à proteção ambiental, caracterizando o dolo, elemento subjetivo dos atos de improbidade”, completa o MPF.
Os procuradores apontam, por exemplo, a mudança de normas de proteção da Mata Atlântica através de portaria do Ministério do Meio Ambiente, deixando de aplicar legislação específica para o bioma para adotar o Código Florestal — o que os procuradores definem como “decréscimo de proteção”.
Outro ponto questionado é a extinção da Secretaria de Mudanças do Clima e Florestas sem que tenha sido criada qualquer outra estrutura na pasta para cuidar do tema.
Também questionam a redução de participação da sociedade civil no Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente, que passou a funcionar com integrantes do governo federal em cerca de 80% dos cargos. “Como resultado dessas mudanças, o caráter democrático e participativo do Conama foi praticamente esvaziado, e houve o aniquilamento da razão de ser do órgão, que é a de congregar diversos setores da sociedade em um fórum encarregado para a elaboração de políticas ambientais”, diz a ação.
A interferência na gestão do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, é outro ponto abordado. Em 2019, em meio à crise diplomática gerada pelo recorde de queimadas na Amazônia, atacou os sistemas de monitoramento do órgão e salientou, em diversos momentos, a intenção de contratar um serviço privado para realizar a tarefa. O MPF cita que as declarações de Salles e do presidente Jair Bolsonaro levaram à demissão do cientista Ricardo Galvão da direção do Inpe. A desestruturação do Fundo Amazônia também é um argumento apontado na ação.
Os procuradores também citam o corte de orçamento para ações de fiscalização da área ambiental. Segundo eles, os recordes de desmatamento registrados em 2019 e 2020 estão ligados aos danos ambientais no bioma. Eles afirmam que a proposta orçamentária enviada por Salles reduziu em 25% os recursos para esse tipo de ação neste ano. “Contra todas as balizas construídas durante as últimas décadas, no entanto, Ricardo Salles decidiu encolher as estruturas do Estado responsáveis pelo combate ao desmatamento e às queimadas e reduzir o papel do IBAMA, de maneira ilegal, a meramente assessorar a forças armadas em tarefa que primordialmente não lhes pertence”, diz trecho do documento.
“Quando considerados de forma isolada, certos atos poderiam indicar o exercício regular de discricionariedade administrativa. Contudo, esta ação demonstra que eles se inserem em um processo de desestruturação, realizado em várias frentes, de forma dolosa, que tem o objetivo de fragilizar a atuação estatal na proteção do meio ambiente. Analisados de forma contextualizada, tais atos promovem a fragilização do arcabouço normativo e institucional e na diminuição da proteção ao meio ambiente. Ou seja, é possível identificar, nas medidas adotadas, o alinhamento a um conjunto de atos que atendem, sem qualquer justificativa, a uma lógica totalmente contrária ao dever estatal de implementação dos direitos ambientais”.
Salles se manifesta através de sua assessoria
“A ação de um grupo de procuradores traz posições com evidente viés político-ideológico em clara tentativa de interferir em políticas públicas do Governo Federal”, diz a nota. Segundo a pasta, as alegações contra Salles “são um apanhado de diversos outros processos já apreciados e negados pelo Poder Judiciário, uma vez que seus argumentos são improcedentes”.
Da redação OEB
com UOL, Folha, Estadão
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