Repasses realizados via contas de offshores foram comprovados mediante procedimento de cooperação internacional com a Suíça
O Ministério Público Federal (MPF) ofereceu, nessa terça-feira (23), denúncia contra Aluísio Teles e Ulisses Sobral, ex-gerentes da Transpetro, subsidiária da Petrobras, e Mario Martinez e Paulo Martinez, então executivos da holandesa A.Hak Industrial Services B.V, por corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da operação Lava Jato, em esquema que movimentou pelo menos R$ 3,9 milhões e fraudou contrato da estatal.
As investigações conduzidas pela força-tarefa Lava Jato no Paraná apontam que no período entre 2006 e 2010, Mario e Paulo Martinez ofereceram e efetivamente pagaram propinas para Teles e Sobral. Em contrapartida, os ex-gerentes praticaram atos de ofício em proveito da empresa, para que ela fosse demandada no âmbito do contrato nº 4600003640 – condição para que obtivesse lucro. Os atos de corrupção começaram ainda na fase licitatória do contrato e perduraram até 2010, quando os agentes públicos deixaram os cargos de gerente na Transpetro. Ao todo, foram 32 pagamentos de propina efetivados a Teles, somando pelo menos R$ 3.767.330,48; e um repasse no valor de R$ 150 mil a Sobral.
Conforme relatado por Teles e Sobral, que confessaram as práticas e colaboraram com as investigações mesmo sem celebrar acordos de colaboração, após o ajuste de vantagens indevidas, os pagamentos foram dissimulados mediante transferências de valores entre contas em nome de empresas offshore na Suíça, configurando crime de lavagem de dinheiro. No curso da investigação descobriu-se, inclusive, que Teles foi orientado a abrir empresa e conta em nome de offshore pelos agentes corruptores, que indicaram o operador financeiro encarregado da abertura da empresa e da conta.
Diversas provas documentais que comprovam a prática criminosa foram obtidas em procedimento de cooperação internacional da força-tarefa Lava Jato com a Suíça. Para o procurador da República Roberson Pozzobon, a atuação conjunta entre o MPF e a Ministério Público suíço foi fundamental. “Os documentos remetidos pelas autoridades suíças possibilitaram comprovar quem eram os reais controladores das contas em nome de empresas offshore utilizadas para o repasse e para o recebimento das propinas. Os denunciados utilizaram estratagemas de ocultação e dissimulação desses recursos ilícitos, e a análise desses elementos apontam indícios robustos de materialidade e autoria do delito”, explica.
Em decorrência dos fatos denunciados, o MPF pediu que seja decretado o perdimento do produto e proveito dos crimes, ou do seu equivalente (incluindo numerários bloqueados em contas e investimentos bancários e os montantes em espécie apreendidos em cumprimento aos mandados de busca e apreensão), no valor total mínimo de R$ 3.917.330,48, correspondente ao valor total dos recursos “lavados” pelos denunciados.
Além disso, o MPF pede, com respaldo nos precedentes do Supremo Tribunal Federal, a condenação dos denunciados por danos morais de natureza coletiva causados à população brasileira em decorrência da prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
“O Código de Processo Penal prevê desde a reforma de 2008 a fixação, na sentença, do valor mínimo para a reparação dos danos causados pelo crime. Apesar disso, apenas recentemente a jurisprudência da Suprema Corte brasileira evoluiu e passou a arbitrar também o montante dos prejuízos de caráter metaindividual, de natureza difusa, sofridos por toda a coletividade, em decorrência de atos de corrupção”, registrou o procurador da República Joel Bogo.
“Padrinho para o contrato” – Conforme apurado pela força-tarefa Lava Jato, em 2006, Teles, então Gerente Executivo de Serviços e Engenharia da Transpetro, foi procurado por Mario Martinez, representante da A.Hak no Brasil, que solicitou que Teles analisasse a possibilidade de incluir a empresa nas licitações da Transpetro – análise essa que resultou favorável, sendo a A.Hak incluída no rol de empresas autorizadas a fornecer serviços à estatal.
Após isso, Mario Martinez procurou novamente Teles e afirmou que, caso a empresa ganhasse o certame, ele receberia o correspondente entre 1% e 3% do valor do contrato, o que de fato ocorreu. A partir dessa primeira tratativa, iniciou-se a série de pagamentos de vantagens indevidas denunciados.
Teles esteve no cargo de Gerente Executivo de Engenharia até o início de 2009, período após o qual Paulo Martinez entrou em contato com Sobral. Durante um encontro, Martinez mencionou a Sobral que precisava de um “padrinho” para o contrato, já que a A.Hak precisava que a Transpetro liberasse o acesso aos dutos para que os serviços contratados fossem executados e pagos. Em troca dessa “proteção” ao bom andamento do contrato, Martinez ofereceu vantagem indevida correspondente ao percentual de 3% do faturamento mensal do contrato, a qual foi aceita por Sobral.
Autos 5030233-91.2020.4.04.7000
Ministério Público Federal no Paraná